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Relações Internacionais e Indicadores de Sustentabilidade

A Ocde e os indicadores de sustentabilidade 


Para alimentar o sonho de um mundo melhor, a OCDE, com o apoio do Banco da Itália e do Centro de Pesquisa da Comissão Europeia (CCI), reuniu em Roma um exército de especialistas sobre o tema “Podemos medir a felicidade? O que estas medidas significam para a ação pública?” para verificar em que medida o bem- estar pode afetar os modelos econômicos e a ação governamental. A felicidade não é uma ideia nova, no entanto, continua difícil de se medir. Esse foi, também, um dos objetivos atribuídos pela OCDE, no âmbito do fórum mundial, em Istambul, em junho de 2007. 

A OCDE parte de uma constatação: a sociedade está cada vez mais preocupada com a sua qualidade de vida. Portanto, é importante integrar na medida do progresso não apenas indicadores econômicos, como o PIB, mas também preocupações ambientais e sociais. 

A renda per capita nacional não dá conta. Um exemplo eloquente, graças ao petróleo: a Guiné Equatorial tem um PIB per capita semelhante ao da Grécia, mas tem uma taxa de mortalidade infantil quase trinta vezes superior. 

A OCDE pretende ir mais longe: quer avaliar a felicidade dos habitantes de um país com o auxílio de indicadores mais elaborados. E por que não orientar as políticas públicas a partir desse critério? Para tanto, a OCDE mantém, em nível internacional, indicadores como a expectativa de vida, mortalidade infantil, obesidade, despesas pública e privada em saúde, desemprego juvenil, desigualdade de rendimentos, população carcerária, rede de transporte e violência nas estradas, mas também o número de pernoites de turistas estrangeiros ou instalações culturais e recreativas 

Referência 
Texto editado de LExpansion.com – Hugo Lattard. 

Trecho da Declaração de Istambul 

“O fato de iniciativas terem sido tomadas em vários países, em todos os continentes, para medir o progresso social através de indicadores estatísticos é animador para nós. Mesmo que essas iniciativas se baseiem em métodos e sistemas culturais diversos, intelectuais diferentes e que o grau de envolvimento dos principais interessados não seja idêntico em toda parte, elas estão demonstrando que existe um consenso sobre a necessidade de avaliar em cada país o progresso das sociedades indo além dos habituais indicadores econômicos, tais como o PIB per capita. Como tal, o sistema de indicadores utilizados pela Organização das Nações Unidas para medir a realização dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio é um passo adiante”. 

“Para melhorar o bem-estar das sociedades, deve ser incentivada, em todos os níveis, uma cultura de tomada de decisões baseada em fatos concretos. Além disso, na ‘era da informação’, o bem-estar depende, em parte, de políticas públicas transparentes, de responsabilidade dos dirigentes. A disponibilidade de indicadores estatísticos sobre os resultados econômico, social, ambiental e sua divulgação ao público podem ajudar a promover uma governança de qualidade e a melhorar o processo democrático. Esses elementos reforçam a capacidade dos cidadãos de utilizar o debate e o princípio do consenso para influenciar os objetivos das sociedades onde vivem e para responsabilizar os atores das políticas públicas.” 

A ONU E OS INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE: rio-92 e A AGENDA 21 
Na Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento – Rio-92, levantou-se a necessidade de desenvolver indicadores capazes de avaliar a sustentabilidade, já que os instrumentos disponíveis, entre eles o PIB, não forneciam dados suficientes para análise. 

O documento final da Conferência, a Agenda 21, em seu capítulo 40, destaca: “Os indicadores comumente utilizados, como o Produto Nacional Bruto (PNB) ou as medições das correntes individuais de contaminação ou de recursos, não dão indicações precisas de sustentabilidade. Os métodos de avaliação da interação entre diversos parâmetros setoriais do meio ambiente e o desenvolvimento são imperfeitos ou se aplicam deficientemente.É preciso elaborar indicadores do desenvolvimento sustentável que sirvam de base sólida para adotar decisões em todos os níveis e que contribuam para uma sustentabilidade autorregulada dos sistemas integrados do meio ambiente e o desenvolvimento” (United Nations, 1992). 

Desde a assinatura da Agenda 21, 178 países concordaram em corrigir distorções geradas por uma avaliação exclusivamente econômica do PIB. Para tanto, deve-se somar a esse cálculo dados sobre recursos socioambientais e subtrair os dados de atividades predatórias e desperdício de recursos, entre outras distorções. Só assim seria possível definir padrões de sustentabilidade e desenvolvimento que incluíssem aspectos econômicos, sociais, éticos e culturais. 

A Comissão de Desenvolvimento Sustentável (CSD) da ONU foi criada na Assembleia Geral da ONU, em 1992, visando assegurar a continuidade da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Rio-92). 

Para tanto, é responsável por acompanhar o processo de implementação da Agenda 21 e da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Além disso, busca prover um melhor direcionamento para que se acompanhe o Plano de Aplicação de Joanesburgo nos âmbitos local, regional e internacional (conhecida, também, como Joanesburgo 2002, Rio+10 ou Cúpula da Terra II, pois foi realizada dez anos depois da Rio-92 para avaliar a implementação da Agenda 21 e dos demais acordos da primeira Cúpula da Terra). 

O Plano de Execução de Joanesburgo (Capítulo X) e a Comissão sobre Desenvolvimento Sustentável (CDS), na sua 11a e 13a sessões, incentivaram a continuação dos trabalhos sobre indicadores de desenvolvimento sustentável dos países, em consonância com as suas condições específicas e prioridades. A CDS-13 convidou a comunidade internacional a apoiar os esforços dos países em desenvolvimento nesse aspecto. 

A terceira revisão de indicadores da CDS foi finalizada em 2006, por um grupo de peritos dos países desenvolvidos e em desenvolvimento e organizações internacionais. A nova edição contém 96 indicadores, incluindo um subconjunto de 50 indicadores básicos. 
As orientações  sobre indicadores e sua metodologia detalhada  já estão disponíveis como uma referência para todos os países, para desenvolverem seus indicadores nacionais de desenvolvimento sustentável. 

O conjunto de indicadores da CDS baseia-se nas duas edições anteriores (1996 e 2001), que têm sido desenvolvidas, melhoradas e extensivamente testadas como parte da implementação do Programa de Trabalho sobre Indicadores de Desenvolvimento Sustentável. 


A ONU E OS INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE: OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO DO MILÊNIO (ODM) E A FELICIDAD E INTERNA BRUTA (FIB) 

Os bons resultados no Butão chamaram a atenção da ONU, que passou a estudar a implementação do exemplo butanês em outros países. Uma versão internacional está sendo elaborada no Canadá, com aplicação prática prevista para este ano. Segundo Michael Pennock (Diretor do Observatório para Saúde Pública em Vancouver, Canadá; consultor sobre o Índice de Genuíno Progresso de Canadá e consultor para as Nações Unidas quanto ao desenvolvimento dos indicadores do FIB no Butão), a métrica do PIB é muito estreita enquanto medida de bem-estar. “Precisamos repensar a maneira como estamos medindo o progresso. O FIB é mais abrangente que o PIB e, diferentemente do que muita gente imagina, é sim baseado em métodos científicos, e não em questões filosóficas e religiosas.” 

O Butão é um dos poucos países que têm registrado bons progressos na consecução dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Segundo o último relatório Bhutan’s Progress: Midway to the Millennium Development Goalshttp://www.undp.org.bt/mdg/MDG_Midway.pdf, que foi lançado em Thimphu, em novembro de 2008, o Butão já atingiu três indicadores dos ODM e está no bom caminho para satisfazer a maioria das outras metas até 2015. 

Por ocasião do lançamento, o secretário-geral adjunto da ONU e diretor regional do Pnud no Butão, o Sr. Ajay Chhibber, afirmou que o Butão é um caso exemplar da transição política pacífica da monarquia absoluta para a democracia parlamentar, com uma gradual criação de instituições e práticas democráticas. Ele enfatizou a necessidade de “aprofundar e reforçar a democracia para capacitar as pessoas”, o que ajudará não só a alcançar os ODM, mas também a fortalecer o processo democrático. O Sr. Chhibber destacou a necessidade de programas orientados ao desenvolvimento que tragam benefícios diretamente aos pobres, melhorem o seu desenvolvimento humano e abordem as causas profundas do seu empobrecimento. Essa intervenção, disse ele, ajudará a resolver os contrastes entre uma série de áreas-alvo dos ODM, tais como incidência da pobreza, desnutrição infantil, segurança alimentar, escolarização primária e acesso à água potável. 

Na ocasião, o coordenador residente das Nações Unidas, o Sr. Nicholas Rosellini, disse que a história de sucesso do Butão em relação aos ODM é atribuída à forte vontade política e ao compromisso do governo em relação à integração dos ODM no âmbito do planejamento nacional. Ele destacou a sinergia entre o desenvolvimento na abordagem da Felicidade Nacional Bruta do Butão e a Declaração do Milênio e disse que “a Declaração do Milênio é guiada pelos valores universais de liberdade, igualdade, tolerância, respeito pela natureza e responsabilidades compartilhadas – ideais que fazem parte integrante do desenvolvimento da abordagem da Felicidade Nacional Bruta do Butão”, que tem ajudado a preparar o caminho para o progresso do Butão nos ODM. 

A ONUE OS INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE: O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) 

Desde 1990, no âmbito do Programa para o Desenvolvimento (Pnud), a ONU calcula e publica anualmente um Índice de Desenvolvimento Humano. Além do PIB, esse indicador agrega, entre outros, a esperança de vida e o nível educacional. Segundo o último ranking, a Noruega apresenta o melhor indicador, enquanto os EUA são classificados em 10º lugar, ou seja, perdendo seis lugares no ranking que leva em conta o PIB per capita. A França é o 16 º. 

“A ONU analisa o indicador com bons olhos”, afirma o economista Flavio Comim, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). “Existem muitas similaridades entre o FIB e a família de indicadores da ONU sobre desenvolvimento humano (tal como o IDH). Ambos procuram ir além da renda (e do PIB) como indicador de bem-estar. Ambos estão preocupados com o indivíduo e a multidimensionalidade de seu bem-estar. Ambos respeitam o papel da autonomia das pessoas como expressão máxima do desenvolvimento. 

“No entanto, o FIB sofre de um conjunto de limitações inerentes ao uso das métricas subjetivas. A felicidade é um conceito intuitivo a todos os seres humanos, mas a sua medida é sujeita a distorções, muitas de caráter psicológico. Talvez a distorção mais conhecida, caracterizada por Isaia Berlin, em 1956, seja a das ‘preferências adaptativas’. Em linhas gerais, pessoas que passam por longos processos de privação desenvolvem mecanismos de defesa contra dificuldades. Aprendem a ficar contentes com pouco. Não ligam que a vida seja difícil. Quando perguntadas sobre a vida, minimizam os problemas, e, via de regra, demonstram um alto nível de felicidade. 

“O problema disso é que o FIB não é proposto apenas como uma medida de bem-estar, mas, assim como o PIB, é posto como um guia para a política pública. O que devemos fazer com aquelas pessoas muito pobres que dizem que são as mais felizes do mundo? Desconsiderá-las? Sabemos que não podemos e que apenas uma medida que mostre objetivamente as privações vividas pelas pessoas pode resgatar um discurso que priorize direitos humanos a preferências frívolas. 

“O FIB é um bom ponto de partida, mas não necessariamente de chegada. Ele possui vários méritos, que devem ser usados para que tenhamos uma medida de bem-estar mais justa e equitativa’’, finaliza Flavio Comim. 


FIB E O OCIDENTE 

Estrutura conceitual do FIB 

O FIB foi articulado por meio de três conferências (Butão, Canadá e Tailândia)(1), que reuniram economistas e cientistas empíricos para identificar os principais determinantes da felicidade, imprimindo uma abordagem totalmente científica na identificação desses fatores primordiais, além de desenvolver uma estrutura baseada em evidências. Ou seja, a estrutura conceitual do FIB não é um construto religioso. Trata-se, sim, de uma estrutura baseada na ciência e no empirismo. 

Na medida em que nós, ocidentais, estamos buscando melhores estruturas conceituais para o progresso, agora podemos nos apoiar no trabalho que já foi feito peles butaneses. 

Versão internacional do FIB 

Uma versão internacional do levantamento está sendo desenvolvida.Ela baseia-se na estrutura conceitual do FIB, usa muitos dos principais itens do levantamento butanês e também incorpora algumas lições aprendidas a partir do uso de um levantamento semelhante, que foi desenvolvido pelo IGP Atlantic (Índice de Genuíno Progresso do Atlântico) e aplicado em duas comunidades na Nova Escócia. Essa versão pode ser autogerida, é transcultural e leva apenas de 20 a 30 minutos para ser preenchida. 

E o que precisamos fazer? 

É o início de um período muito estimulante. Precisamos desenvolver: 

• ferramentas que meçam o bem-estar ou a felicidade nos âmbitos nacional, regional e local, bem como seus respectivos fatores contribuintes; 
• ferramentas de política pública, tais como “lentes de política”, que possam ser usadas para fazer avaliações de impacto na felicidade, de modo que possamos ser mais competentes ao assegurar que tais políticas irão de fato promover a felicidade; 
• colaboradores internacionais, para que todos possamos aprender uns com os outros e promover o FIB dentro das nossas jurisdições. Existem alguns bem interessantes “começos” que estão sendo deflagrados ao redor do mundo, mas são apenas “começos”. Precisamos trabalhar em conjunto, para gerar suficiente impulso e, com isso, manter esse movimento avançando. 

Trecho da palestra de Michael Pennock. Diretor do Observatório para Saúde Pública em Vancouver, Canadá, e consultor sobre o Índice de Genuíno Progresso no Canadá. Consultor para as nações Unidas no desenvolvimento dos indicadores do FIB no Butão e coordenador da colaboração internacional na implementação do FIB. 

(1) A quarta conferência deve ser realizada no Brasil, em novembro de 2009. 



http://www.compendiosustentabilidade.com.br/compendiodeindicadores/introducao/default.asp?paginaID=25&conteudoID=309

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